Hawker Typhoon Mk.Ib “Boca de Tubarão” Eduard/Hasegawa 1/48
Introdução
Depois de fazer o inbox review dessa interessante edição especial que junta o já clássico kit da Hasegawa com diversos acessórios produzidos pela Eduard, incluindo fotogravados e peças em resina e decais da Cartograf, decidi me aventurar e produzir um modelo de um verdadeiro pássaro raro entre os Typhoons, o MP197 MR-U – até onde se tem registro o único decorado com uma nose art de boca de tubarão, um adorno raríssimo entre os aviões que operaram como parte da rígida 2nd Tactical Air Force no front Ocidental nos últimos meses da II Guerra Mundial. O review está neste link, pra quem não acessou ainda:
Este avião era dotado de capota em bolha (um “Slider”, em oposição aos “Cardoors” que era a configuração das primeiras séries) e portava foguetes (um “Rockphoon”, em oposição aos “Bombphoons”, lembrando que operacionalmente os esquadrões especializavam-se em um ou outro armamento). Embora não possuísse o filtro de ar “tropical” da Vokes, ele tinha instalada à frente do conjunto do radiador e tomada de ar no seu “queixo” característico uma espécie de porta basculante para evitar a ingestão de detritos no solo nas bases improvisadas de onde muitas vezes eles operaram, apelidada de “cuckoo dor”. Como normalmente acontecia com os rockphoons, o MP197 tinha os faróis dos bordos de ataque das asas removidos e se espaço coberto por chapas de alumínio. Como um Typhoon das últimas séries, ele também possuía os profundores aumentados aproveitados do desenvolvimento do Tempest – que ajudaram a resolver parte dos problemas aerodinâmicos que causavam estresse estrutural na cauda e muitos acidentes. A hélice era de quatro pás, diferentemente das hélices tripás das séries iniciais do Typhoon. Tanto a hélice quadripá, sua base e cubo quanto os profundores aumentados não constam do kit da Hasegawa e são oferecidos pela Eduard como (belíssimas) peças em resina.
A decoração proposta pela Eduard (Esquema E) ilustra o Typhoon MP197 em julho de 1945, já adornado com marcações específicas do seu Esquadrão, como uma faixa quadriculada em azul e branco na cauda e cubo de hélice, portas internas do trem de pouso e a “cuckoo door” da entrada de ar do carburador pintadas também em azul. Além, é claro, da sua conspícua boca de tubarão.
O MP197 (Esquema E) em Schleswig após o encerramento das hostilidades, já com a sua pintura final ostentando a boca de tubarão e a faixa xadrez azul na fuselagem
Um pouco da história do Typhoon
A proposta da Hawker para a “geração seguinte” de caças ingleses, concebida antes mesmo do primeiro vôo do Hurricane em 1937, também nasceu da prancheta de Sidney Camm. Dentro da mesma estrutura básica, o novo caça poderia ser impulsionado pelos poderosos motores Rolls Royce Vulture e Napier Sabre, ambos da classe dos 2000 cavalos. O primeiro projeto, chamado de Tornado, naufragou junto com o complexo motor RR Vulture, que arrastaria para o esquecimento também o bombardeiro Avro Mancester. O segundo, apesar de todos os problemas do motor Sabre, vingou e recebeu o nome de Typhoon.
A concepção do Typhoon mantinha vários aspectos do Hurricane, como a estrutura tubular da fuselagem dianteira e as asas grossas. Sólida para meados dos anos 30, essa abordagem revelou-se problemática no mundo real quando acoplada a um motor muito mais possante. Problemas aerodinâmicos graves de compressibilidade nas asas e de vibração na cauda surgiram em velocidades mais elevadas, o que levou Camm a rapidamente reavaliar as asas do Typhoon e conceber o Typhoon II (depois chamado de Tempest). O motor Sabre, pelo seu lado, apresentou diversos problemas de confiabilidade que quase comprometeram todo o projeto. Mesmo contornada a parte crítica dos problemas de confiabilidade, o Sabre não apresentava um desempenho bom acima de 12.000 pés, o que limitava substancialmente as ações do Typhoon como caça.
Afora alguns nichos como a interceptação de intrusos em baixa altitude, o destino do Typhoon era incerto por volta de 1942-43, quando a evolução da Guerra demonstrou que a cobertura às forças de terra (CAS) e a interdição ao campo de batalha eram funções importantes para as quais a RAF não dispunha de uma plataforma específica. Com sua enorme capacidade de carga útil e excelente desempenho em baixa altitude, o Typhoon revelou-se uma excelente opção. Em outubro de 42 os primeiros Typhoon “bombardeiros” chegaram ao Esquadrão 181, e ao final do ano todos os novos Typhoons eram capazes de carregar bombas.
O sucesso do Typhoon foi enorme nos fronts onde foi empregado, servindo aos britânicos como o Il-2 Sturmovik soviético, o P-47 Thunderbolt americano (também usado nessa função pela FAB na Itália) e o pioneiro Ju-87 Stuka alemão.
Ao longo do seu tempo operacional, o Typhoon sofreu diversas atualizações que aumentaram a sua confiabilidade, desempenho e poder de fogo. Entre elas, a opção de levar até 8 foguetes não guiados RP-3, a revisão do sistema de filtragem de poeira para operação nos campos avançados próximos ao front, a revisão das rodas do trem de pouso e a profundores revisados (emprestados do Projeto do Tempest) que junto com a adoção de uma nova hélice de 4 pás ajudou a mitigar o grave problema de vibração na cauda. Somados ao canopi em bolha de alta visibilidade e a diversos reforços estruturais, no inverno de 1944-45 o Typhoon era um temível oponente para Wermacht com seus foguetes e bombas, especialmente quando a superioridade aérea estava garantida.
Sobre o uso de foguetes e bombas, uma curiosidade: embora ambos pudessem ser instalados em todos os Typhoon, a prática operacional da 2ª TAF determinou que os esquadrões (e consequentemente suas aeronaves) fizessem uso somente de bombas ou somente de foguetes, criando os esquadrões de “Bombphoons” e os “Rockphoons”.
Algumas boas referências para saber mais sobre o Typhoon são as Monografie Lotnicze 94 e 95, o Squadron/Signal In Action nº102 (Typhoon e Tempest In Action) e o Typhoon Wings of 2nd TAF 1943-45 (Osprey Combat Aircraft nº86). Os livros de Kev Darling sobre a família Typhoon/Tempest/Sea Fury (Crowood Press, 2003) e de R.T. Bickers (Hawker Typhoon – The Combat History, Airlife Pub., 2002) também trazem muitas informações interessantes sobre o Typhoon. Uma leitura interessante relacionada aos Typhoon e que infelizmente não possuo deve ser o relato dos anos de combatente do S/L Tony Zweigbergck, um dos pilotos do MP197, escrito por sua filha Britta (Tony’s War, Pegasus Ellitt Mackenzie Publishers, 2007).
A Montagem
Primeiramente, uma picotada nas árvores pra colher as peças principais e um primeiro dryfit pra começar a pensar a estratégia para atacar o modelo:
Como era de se esperar, o avião é grande pra caramba e os encaixes são padrão Hasegawa. Promete.
Mas a famigerada fresta entre os inserts do canopi não é lenda:
Vou pensar qual o jeito menos traumático para atacar esse problema.
Antes, vou preparar o interior do cockpit pra só então ver como ele se insere e então pensar se vale a pena inserir um pedaço de plasticard na fresta ou se dá pra simplesmente apertar bem a junção e usar só massa… meu medo é que alargando a fuselagem o para brisas e o canopi fiquem estreitos e corrigir isso pode ser um pesadelo. Veremos!
Enquanto isso, picotei as peças básicas do cockpit pra limpá-las mais tarde e começar de fato a montagem.
Limpei as peças do cockpit e comecei a aplicar os PEs. Tem muita coisa ainda pra aplicar!
Colei no lugar aquele plug pra fazer o cockpit “bubbletop”. Lembrando, a Hasegawa fez esse esquema de modo a aproveitar 90% da fuselagem, que é a mesma dos “cardoor”.
Primeiro, cola nas extremidades de vante e ré, depois colei a aresta inferior. Com isso deu pra garantir o melhor alinhamento possível:
Uma passadinha de lixa e ficou certinho:
E a fresta na junção superior ficou evidente, porém tratável:
O problema é que esse plug cria umas linhas de painel inexistentes, que marquei em vermelho e devem ser eliminadas:
Vejam fotos do 1:1
A solução foi emassar, depois de lixar a gente limpa qualquer imperfeição nas linhas de painel:
Por enquanto é isso, vamos continuar com os PEs do cockpit e em paralelo vamos ajustando aquelas linhas de painel inexistentes.
e o problema eram aquelas linhas de painel…
BRAVO ZULU
E a faxina dos PEs continua… hora de usar a paciência!
Dryfit do cockpit com alguns dos PEs, antes de pintar.
As partes da “gaiola” estão apenas apontadas com cola branca – preciso desmontar senão fica complicado pintar.
Evidentemente, os PEs coloridos só entrarão depois.
O painel ainda é o do kit – talvez eu recorte um em plasticard pra fazer a base pro PE colorido, é um pecado sacrificar essa peça.
O mesmo vale pro assento, dobrar o PE vai ser assunto pra hoje de noite.
Fiz uma base em plasticard pra não sacrificar este painel, ele é muito bacana e usado com os decais pode ser útil um dia para alguém.
Problemas!
Após o dryfit do cockpit, percebi que havia algo estranho com a placa de blindagem: (1) não havia espaço entre o assento e a placa (por onde desce o cinto de segurança) e (2) ficava um gap entre o final da fuselagem e a placa. Fui conferir as instruções e reparem que a Eduard manda colar a peça em PE de forma diferente da que ela está originalmente moldada:
O resultado ficava assim:
Descolei a peça e recoloquei-a da forma que acho mais correta:
O resultado ficou assim, acho que o posicionamento da placa de blindagem agora está correto:
E eu que pensei que os problemas tinham acabado…
Fui preparar o assento do piloto em PE, muito bacana, todo detalhado.
Pra quê.
Estranhei o tamanho do assento… parecia muito grande. De fato, era muito maior que o do kit – que já me parecera grande. Bom, vai ver que o pessoal da Hawker gostava de conforto – fui ver fotos do cockpit na internet. Não, é um assento “normal” pra época, nada grande demais.
Peguei uma figura de piloto 1:48 (dum 109E da Tamyia), medi o cara – ele devia medir 1,70 mais ou menos – e “sentei” ele nos assentos. No do kit, proporcional.
No PE da Eduard… parecia que ele estava sentado num trono!
Francamente, parece que o “cara da calculadora” da Eduard atacou de novo.
Uma pena, esse kit é mais bacana que o original da Hasegawa (e caro) também por causa desses acessórios. Este não vai servir pra nada, a não ser que apareça algo 1/32 precisando…
Vamos ver as demais peças dessa folha de PE nos próximos dias, agora também estou suspeitando do resto.
Resumo da ópera: Não precisam perder o seu tempo com esse assento em PE, usem o original da Hasegawa – basta dar uma afinada…
Após um bocado de trabalho no assento, vamos começar a fechar este cockpit.
Primeiramente, uma demão de white aluminium da AK nas peças básicas, pra embasar a pintura. Há pouco consenso na literatura sobre a cor dos cockpits dos Typhoon, o que me parece é que eles foram inicialmente pintados em interior green mas foram aos poucos passando a serem pintados em night (preto) nas áreas próximas ao piloto, recebendo um primer alumínio na estrutura tubular, nas partes inferiores do interior e no assento do piloto. Resolvi seguir esse esquema, que é coerente com o interior do Typhoon restaurado e do cockpit que está no Museu da RAF., bem como em boa parte das fotos de exemplares das últimas séries, mesmo as em P&B. Posso estar equivocado, mas é o que foi.
Aproveitei a deixa para acrescentar alguns PEs que ficam nas metades do cockpit, alguns boxes de controles e a catraca do canopi. Uma análise mais atenta desses itens feita depois que tudo estava já fechado apontou algumas inconsistências entre o proposto pela Eduard e o que era instalado nos cockpits dos “sliders”, os Typhoon com capota em bolha – por exemplo, na metade de bombordo entra um box que é claramente o seletor de frequências do rádio, que realmente estava lá nos “cardoors” mas que foi movido para o console de boreste, ao lado do assento. Acabei deixando esse box lá, deixa o cockpit mais “cheio”, mas agora estou convencido que isso não é acurado. Paciência, está lá e o dano de tentar refazer tudo com a fuselagem fechada seria maior que o benefício…
O próximo passo foi fazer o “forro” do assento do piloto. Pelo que consta, uma peculiaridade do assento do Typhoon é que o espaldar do assento era vazado e as costas do piloto apoiavam-se em uma teia de elásticos coberta por uma forração em couro. Isso foi uma adaptação para fazer a pilotagem um pouco mais confortável absorvendo parte da enorme vibração causada pelo motor, que incomodava bastante os pilotos. O assento original não representa esse forro, que tem um padrão “diamante” bem característico e um cadarço visível que o fixava ao banco na parte superior. Depois de algumas tentativas, fiz uma peça em scratch com plasticard e um cadarço em fio de cobre bem fino, “costurado” na peça. Uma vez pintado acho que ficou razoável.
A alavanca de elevação do assento é oferecida em PE, mas a alavanca em si ficava muito pouco espessa, substituí ela por um pedacinho de plástico. Pintado, dá pra enganar.
A mesma coisa fiz com a manete do “acelerador”.
Tudo pintado, mais dryfit e descobri mais um problema, agora com a placa de blindagem. Colada na estrutura como indicado, ela fica baixa demais – forçando o assento a ficar com as “costas” numa posição incompatível com as fotografias. Talvez porque as fotos mostrem o assento na posição mais elevada. Removi mais uma vez a placa, “subi” ela com um pedacinho de plasticard até a altura correta e ok. Aí descobri que a parte mais circular da blindagem, atrás da cabeça, ficou alta demais e não permitia que o canopi ficasse corretamente no lugar. Olhando para as fotos, de fato essa parte da placa é grande demais… limei com auxílio do motorzinho essa parte encurvada até que o canopi “entrasse” no lugar.
Nova pintura na placa, últimos PEs no lugar (deixei os cintos verticais para montar mais para o final), painel de controle com as trocentas alavanquinhas e retoques sempre necessários (não é necessário sequer usar a peça de plástico para apoiar o painel, colei ele só no PE mesmo e ficou OK), manche OK e no lugar, finalmente o cockpit ficou pronto.
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Uma última peça é o conjunto de radiador/entrada de ar do queixo. Como vou fazer um avião com o filtro de poeira “cuckoo door”, tive que usar a peça que faz um pequeno cilindro em PE, uma peça sempre complicadinha mas que ficou bem correta.
Hora de fechar o pastel!
Antes de tudo, uma pegadinha oculta nas instruções. A área da capota que fica para dentro do para-brisas do Typhoon deve ser removida (limada), ela é “vazada” e a mira fica apoiada por uma estrutura tubular que, a propósito, é oferecida em PE no kit. É importante cortar fora e dar um acabamento nessa área antes de fechar a fuselagem, fazer isso depois quase certamente danificará alguma coisa dentro do cockpit. Fica a dica!
Como já havíamos visto anteriormente, formou-se uma fresta relativamente grande na emenda das metades da fuselagem na área do plug que forma o cockpit “slider”. Na parte traseira foi possível trabalhar com um pouco de lixa para atenuar a fresta e confiar no emassamento – até porque boa parte dessa área será coberta por uma peça em PE.
Já na parte entre o para-brisas e o motor foi necessário colar um pedacinho de plasticard para fechar a maior parte da fresta; o acabamento seria com massa e lixa. Sempre lembrando que o Typhoon não tem uma linha de painel separando as metades da fuselagem; o “topo” da fuselagem é sempre composto por placas inteiriças, seja na tampa do motor, na cobertura do tanque de óleo e na fuselagem traseira (o mesmo vale para a porção inferior da fuselagem e do “queixo”). Isso de uma certa forma facilita o trabalho, é só colar direitinho e emassar e lixar de acordo.
A boa notícia é que temos um “chassis” Hasegawa, ou seja, o encaixe é muito bom e o alinhamento muito pouco problemático. É claro que este manza aqui deu uma vacilada na porção inferior da fuselagem e teve que ajustar um pouco mais que o necessário, mas nada demais.
De fato, ficou uma pequena linha marcando a emenda das fuselagens, natural do processo de colagem. Após tudo bem seco, preenchi essa linha e as frestas que restaram – especialmente nas áreas adjacentes ao plug do cockpit, que ficou menos bem encaixado – primeiro com cianoacrilato e depois um acabamento com massa. Usei a massa cinza da Tamyia e a Mr. Dissolved Putty da Gunze, excelente para esse serviço mais fino (essa massa nada mais é que o putty branco deles pré-dissolvido com o diluente da Mr. Color). A aplicação pode ser feita com um palitinho e uma vez seca (leva um tempo pra isso), lixa perfeitamente e o acabamento é impecável. Coisa de japonês!
Durante o processo de lixagem descobri que iria rapidamente quebrar a frágil placa de blindagem com a minha mão pesada. Fiz então um “santantônio” para proteger a área do cockpit, o que foi bom também para manter o cockpit livre de pó de lixa.
Em paralelo, furei as asas inferiores para receber os foguetes (este será um RockPhoon), o pitot e o estribo e juntei as partes. O encaixe é muito bom, exceto que sobra uma pequena fresta nas laterais dos canhões e aquela linha inevitável da emenda. Nada que um pouquinho de Mr. Dissolved Putty e lixa não resolvam.
Fiz em scratch algum cabeamento, etc no assoalho por debaixo do cockpit para não deixar aquela área muito “nua”. Um wash e a asa está ok para emendar.
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A emenda das asas à fuselagem é excelente, chega a fazer um “click”. Ficou uma fresta realmente mínima na raiz da asa. Uma passada de Mr. Dissolved Putty, limpo com um cotonete úmido em acetona, e pronto. Um pouquinho de massa e lixa foi necessária também na porção inferior da emenda, apenas para alisar a linha de colagem.
Os RockPhoons tinham os faróis das asas removidos e seus compartimentos eram fechados com metal – rapidamente descobriram que o jato dos foguetes e as coberturas de acrílico dos faróis não combinavam muito bem. As instruções (corretamente) indicam isso. Colei os faróis no lugar, uma camada de massa, lixa e tudo liso. Aproveitei para colocar também as luzes de navegação, sem esquecer de fazer aquele pequeno furinho em cada peça e preencher com tinta para simular os bulbos das lâmpadas, verde boreste, encarnado bombordo. O kit fornece a combinação correta, nos Typhoons as coberturas das luzes de navegação eram transparentes e as lâmpadas é que eram coloridas (em vários outros aviões da época, as coberturas é que eram coloridas, mas este não é o caso).
Próximos passos, limpar tudo, rever algumas linhas de painel e pequenos erros, primer, novos retoques…
Estamos nos aproximando da fase da pintura, portanto é hora de concluir alguns detalhes do cockpit como por exemplo a mira. Como já havia avisado, a mira do Typhoon é suspensa em uma estrutura tubular, algo diferente da peça oferecida em PE pela Eduard. Usando-a como base, fiz uma em scratch com barrinhas de estireno da Evergreen. Poderia ter ficado mais acurada, mas certamente é bem melhor que o que o kit oferece. A propósito, a mira dos Typhoon de final da Guerra era um modelo modificado projetava apenas um ponto e uma retícula simples diretamente no parabrisas – ideia do Roland Beamont para facilitar o uso como caça bombardeiro. Consequentemente, a mira desses Typhoon não tem aquele vidro inclinado como se vê por exemplo na mira dos Spitfires. Alguns já no final mesmo usavam a “acemaker”, que era mais “quadrada”, mas o avião que vou montar pelas fotos usava mesmo essa modificada.
Pra fazer ela, cortei fora o vidrinho inclinado e fiz um “refletor” no topo. Lembra de longe a verdadeira, mas parece-me menos incorreta que a do kit. Pintei-a de preto, aparentemente essa do museu está no metal polido, mas não parece ser o caso das operacionais.
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Fiz em scratch as luzes de navegação de ré (brancas), que ficam na parte de ré da raiz dos profundores. Usei a haste de um palitinho de café transparente, cortado, lixado e polido de acordo.
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Parabrisas no lugar, transparências mascaradas (o esverdeado é máscara líquida já seca). Primer preto para fazer a face interna das molduras e caixas de rodas, Nessa últimas uma demão de White Aluminium (Extreme Metal) da AK, depois mascarados com pedacinhos de espuma fina.
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Contra a minha prática usual, colei no lugar os profundores que são em resina (são maiores do que os do kit – os Typhoon das últimas séries usavam os profundores do projeto do Tempest, que finalmente resolveram os problemas aerodinâmicos que causavam vibrações na cauda). Normalmente gosto de colocar os profundores no final, facilita a pintura, aplicação dos decais, etc – mas o encaixe ainda mais de peças coladas com CA exigiria uma atenção maior que poderia danificar demais a pintura.
Mascarei as luzes de navegação (não vêm pré-cortadas, mas é fácil fazer com fita Tamiya) e as entrada e saída de ar dos radiadores do queixo e apliquei uma demão geral de primer cinza (poliester Dryco).
Claro que defeitos aparecem, bastante deles por sinal. Corrigidos dentro das possibilidades, um polimento e mais primer.
A faixa amarela do bordo de ataque das asas foi pintada e mascarada (acabei não fotografando).
Próximo passo, pintura! Tinha usado o primer poliéster do Dryco, intercalado em cada demão com “o paninho” de microfibra, uma forma excelente de tirar aquela poeirinha que se forma quando as demão de tinta são aplicadas bem finas e fazem a superfície paulatinamente mais rugosa. Uma outra ferramenta muito útil nesse processo de “polimento” entre as demãos é uma escova de dentes. Eu lanço mão de algumas, todas elas velhas conhecidas dos meus próprios dentes. A tinta seca muito rápido, o que adianta bastante esse trabalho de polimento.
Naqueles dias a bancada estava tão bagunçada que rolou um colapso nos trabalhos e tive que dar uma pausa pra limpeza e reorganização. A minha bancada na garagem fica praticamente ao ar livre, não há janelas por exemplo. Isso é ótimo em termos de ventilação, posso usar qualquer produto sem ter que ouvir reclamações ou ficar violentamente intoxicado, mas é um pesadelo pra acumular poeiras de todas as origens e naturezas. E como aqui em casa não temos empregada – outro terror dos modelistas – em compensação a limpeza “é comigo”. Aqui uma panorâmica da bancada “arrumadinha” logo após a aplicação do primer:
A pintura de camuflagem da RAF do período é um processo relativamente simples, mas que requer algum mascaramento. Usei novamente tintas poliéster automotivo do Dryco ao longo do processo.
A faixa amarela do bordo de ataque veio primeiro, precedida de uma demão de primer branco no local (tintas amarelas em geral são meio translúcidas e para garantir que a cor final será a desejada sem necessidade de várias demãos um fundo branco é muito recomendável; isso vale para outras cores como os vermelhos).
Uma vez mascarada a faixa com fita Tamiya, apliquei o Medium Sea Grey no fundo, mascarei a demarcação e apliquei uma camada de Ocean Grey nas superfícies superiores. É, não fiz nenhum pre-shading mesmo, desta vez vou fazer todo o envelhecimento na base de washes e filtros.
Para as áreas em Dark Green, na falta de uma cômoda máscara pré-cortada tipo da AML, fiz a demarcação com cobrinhas de massa limpa tipos. Pra quem não conhece, a limpa tipos é um velho aliado dos desenhistas analógicos do Século XX que serve como apagador para desenhos com grafite (lápis). Inicialmente o bloquinho vendido parece uma borracha de apagar, mas a massa é maleável e pode ser conformada com os dedos, ficando bastante elástica depois de trabalhada. Ela “gruda” muito suavemente no modelo, especialmente se se aplicar um pouquinho de pressão com os dedos mas não deixa praticamente nenhum resíduo ou mancha após removida como fazem as Silly Putty e Blu-Tack / Pritt Tack da vida. É barato, reutilizável e encontra-se em qualquer boa papelaria ou loja de artes e desenho.
Mascaramento removido, felizmente nenhum retoque necessário, algumas camadas bem finas de Future (o legítimo!, mas vale qualquer bom verniz acrílico) e estamos prontos pros decais
Antes de passar para os decais, vou relatar um pequeno drama.
O cubo da hélice de quatro pás, necessária para esse modelo, é uma (aliás belíssima) peça em resina oferecida pela Eduard como parte do kit. O kit-base da Hasegawa traz somente a hélice de três pás.
Na hora de tirar o cubo a pontinha dele “quebrou” e tive que emassar (o ponto branco na ponta da peça) e remover também os pontos de injeção do cubo que são na superfície externa, tem que lixar até sumirem.
Na foto, o final feliz com a peça já lixada como planejado:
Para manter a simetria – lixar a resina que é muito macia na mão quase certamente iria deformar a peça – preferi usar o motorzinho como um torno pra lixar sem criar buracos ou ficarem corcovas nos pontos de entrada da resina. O drama foi que na primeira tentativa liguei com uma velocidade alta demais e a peça voou, bateu no teto da garagem e sumiu. Podia ter ido parar em qualquer lugar nessa área:
Dei muita sorte de achar: ela deve ter batido no teto perto da lâmpada, passou entre os galhos da jaboticabeira e caiu no meio do quintal ao lado de um vaso de orquídeas.
Um pequeno milagre de Natal achar a peça no chão – isso aconteceu em 26 de dezembro!
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Já estava bolando algum estratagema envolvendo retrabalhar o cubo do kit (da hélice de três pás) ou mesmo mandar uma cartinha chorosa pra Eduard pra tentar um cubo de reposição…
Dessa vez prendi o cubo de forma mais positiva na ponta giratória e fui aumentando a velocidade bem lentamente. Funcionou maravilhosamente!
Pelo menos esse modelo vai ter uma história pra contar
Passado o susto, hora dos decais.
Foram três demãos generosas de Future para deixar o kit um espelho, afinal o esquema escolhido prometia problemas. Deixei curar uns três dias na estufa natural que a minha garagem é no verão, criei coragem e comecei seguindo um caminho que poderia ser revertido caso algo “desse errado”.
O MR-U, o Typhoon de boca de tubarão, é um avião razoavelmente bem documentado, com fotos durante e após a Guerra.
O esquema que escolhi inicialmente, e que é o proposto pela Eduard, tem além da boca pintada, uma faixa na fuselagem quadriculada em azul e branco, um campo pintado de branco a boreste do cockpit – especula-se que seria o campo para uma outra arte que nunca foi documentada – e o cubo da hélice, a face interna das tampas dos trem de pouso e o “cuckoo door” no nariz pintados de azul.
O primeiro desafio era achar um azul que correspondesse ao da tal faixa da fuselagem, fornecida como um decal.
Por muita sorte, eu tinha um azul (“azul vivo interior”), um poliéster automotivo do Dryco que tinha comprado para ser uma cor básica para misturas e que deu um match praticamente exato. Parece um azul royal, nada a ver com as cores “de camuflagem” que compõem 99% das tintas que tenho aqui. E, já vou adiantando, não tem muito a ver com a cor da Gunze sugerida nas instruções.
1×0, mas não pintei nada de azul por enquanto.
O passo seguinte foi tentar aplicar a boca.
Impressionante esses decais da Cartograf. Sim, estão novinhos e isso deve ajudar, mas a forma deles (a “boca” consiste de fato em duas peças, unidas pela linha de cento entre a hélice e o radiador) foi impressionantemente bem preparada, a área é feita por uma série de curvas compostas que devem ser o pior pesadelo de um designer de decais. Com todo o respeito, bastante MicroSet antes de aplicar o decal para facilitar o escorregamento, cada metade assentou escandalosamente bem nas faces do nariz. Muito reposicionamento a úmido, umas apertadinhas com um cotonete, um pouco de MicroSol aqui e ali, uma passada de lâmina nova para ajudar a descer em alguma linha de painel mais renitente e a aplicação da “boca” ficou praticamente perfeita.
2×0. O plano “B”, caso a boca desse errado, seria fazer um outro esquema mais careta de “Rockphoon”, tinha opções na folha de decais para tanto.
Agora, a faixa da cauda. Decais quadriculados normalmente dão problemas de alinhamento, mas depois de algum reposicionamento (o bizú é sempre manter o decal bem umedecido, usando sem pena MicroSet e água) ele alinhou que nem acoplamento de nave espacial. Se pintasse jamais ficaria tão certo. E, se desse errado a faixa, o “Plano C” seria fazer o MR-U em combate, quando não tinha nada daquelas papagaiadas exceto a boca de tubarão. Sem faixa na cauda, cubo da hélice preto e etc.
3×0, placar garantido, o resto dos decais foi uma moleza só. Inclusive os estênceis da Eduard.
Aí sim eu pintei aquelas peças de azul! 😀
Tudo OK? Nada!
Alguém se esqueceu de fazer um decal praquelas faixas antiderrapantes na raiz das asas (ou, melhor, alguém aqui esqueci de conferir se tinha decal pra elas).
Pintar o jeito é, diria Yoda.
Mascarar modelos com decais já aplicados sempre é um risco, e assim optei por um método de mascaramento menos agressivo, e mesmo assim somente após um par de demãos de future para selar os decais e dar algum grau de segurança quanto a corrigir algum imprevisto. A ideia é usar o mínimo de fita – e sempre que possível sem encostar nos decais já aplicados – e mascarar o resto todo com filme de PVC, aquele que a gente usa na cozinha. Excelente, o kit fica “plastificado” e como o PVC não adere não danifica nada. Fica a dica pra quem nunca tentou e precisa manusear o modelo já nas fases finais sem comprometer o acabamento.
A faixa foi pintada com o excelente acrílico da K4 do amigo Richard Ordenes, do Chile. O resultado ficou bastante satisfatório para mim.
Depois tem mais, está acabando!
Faltavam agora o weathering e as miudezas, trem de pouso, antenas, pitot, etc. A instalação dessas peças, algumas bastante delicadas, transcorreu sem nenhuma intercorrência. A antena de VHF foi feita em scratch com um pedacinho de fio de cobre, a peça da folha de fotogravados é totalmente inacurada comparada com as fotos dos Typhoon.
Sobre o Weathering, aplicado antes das peças miúdas, digo que não gosto muito do estilo dito “moderno” de envelhecimento que é uma espécie de moda ultimamente.
Chegamos ao paroxismo de as pessoas representarem máquinas que tinham no máximo alguns meses de existência como se estivessem abandonadas em um ferro-velho por décadas. OK, as condições do front eram duríssimas, as equipes de manutenção eram sobrecarregadas e detalhes como pintura eram francamente supérfluos, mas pelas fotos vê-se que mesmo máquinas tidas e tratadas como descartáveis não eram tão desgastadas assim, salvo raras exceções. Essa percepção se aplica especialmente o objeto deste projeto, um avião que “sobreviveu” à Guerra e agora, em tempos de paz, recebia um tratamento digamos, mais digno.
As fotos do MR-U tiradas após a guerra mostram um avião com um grau relativamente baixo de desgaste, no máximo alguns arranhões e um queimado discreto na pintura próximo dos escapamentos, algum inevitável óleo escorrendo do motor e de resto uma estrutura limpa e até um pouco polida, não fosco chapada como pode ter sido nos duros meses de serviço em combate.
Assim, com isso em mente, restringi-me a acentuar muito discretamente as linhas de painel, sempre com tons próximos ao da pintura base apenas para dar uma ilusão de volume, fazer algum chipping com um lápis Prismacolor nas áreas de maior tráfego (sobre os walkaway das asas e na borda do cockpit, por exemplo). Para simular um pouco de queimado na pintura, que de qualquer forma deveria ser recente datando de poucas semanas ao sol do verão de 1945, apliquei um filtro com tinta óleo branca e beige, muito diluída a ponto de ficar quase imperceptível – só para quebrar o chapado da camuflagem. Um verniz semibrilho do Dryco poliéster automotivo para selar tudo e pronto.
Para as rodas e os escapamentos usei os excelentes conjuntos em resina da linha Brassin da Eduard. Os detalhes dessas peças são excepcionais e realmente eles adicionam bastante valor a áreas nas quais a Hasegawa não caprichou tanto.
Os cubos das rodas foram pintados com alumínio da linha Extreme Metal da AK e os pneus com preto e “pneu” da K4, tudo sobre uma base de Stynylrez preto gentilmente cedido pelo amigo Inimá e que uso parcimoniosamente em áreas nobres de projetos selecionados.
Os escapamentos partiram de uma base de Dark Iron (Mr. Metal Color da Gunze), uma tinta aplicada a pincel e depois “polida” com um pincel seco. O efeito é incrível, fazendo um tom de metal queimado ótimo. Em seguida, um pouco de ferrugem com um Exhaust Wash Rust da AK e um pouco de pigmento Rust, fixado com água raz. Depois de pintadas, o trabalho foi colar com CA.
As últimas peças adicionadas foram os trilhos dos foguetes. Aproveitando a oportunidade oferecida pelo kit, que traz os foguetes separados dos trilhos, dei um acabamento caprichado nos trilhos e os instalei sem os foguetes, como aliás ficavam os Typhoon no solo até pouco antes de sair em missão. Ademais, as fotos do MR-U o mostram assim, sem foguetes mas com os trilhos no lugar.
Para dar uma pequena variada no quase clichê que são os cintos de segurança arrumadinhos e paralelos, posicionei um deles com a ponta saindo para fora do cockpit – como aliás muitas fotos mostram esse arrnjo que facilitava a entrada e a acomodação do piloto no cockpit.
E finalmente, quase cinco meses depois de iniciado, temos o nosso Typhoon pronto.
No último capítulo, a seguir, colocarei alguns comentários mais conclusivos sobre o Projeto e fotos mais bem produzidas do modelo pronto.
Finalizando,
Fiquei bastante satisfeito com o resultado final, bastante próximo do que eu esperava ao iniciar. Este foi um projeto que acabou demorando bem mais do que eu esperava, praticamente cinco meses, muito em parte da concorrência desleal que outras atividades exercem sobre o modelismo. O que creio seja uma dificuldade comum a todos nós.
Foi bastante divertido superar as dificuldades surgidas ao longo do projeto, especialmente as iniciais, várias criadas por mim mesmo. Creio que os problemas que encontrei com a placa de blindagem, o assento fotogravado e o suporte da mira podem ser contornados ou simplesmente ignorados. Em perspectiva, esses detalhes praticamente desaparecem no escuro cockpit do Typhoon. Tive a oportunidade de testar algumas novas técnicas, materiais e insumos, ou seja, em termos de aprendizado foi também bastante positivo.
Se faria uma nova tentativa com esse mesmo kit? Nada contra, mas há muitos outros projetos na fila aguardando a vez. Talvez um dia eu revisite o Typhoon, mas provavelmente farei um “Cardoor”.
Se eu recomendo esse kit para um colega? Definitivamente sim, tem bastante trabalho e diversão nesse pacote oferecido pela Eduard. Somente recomendaria adquirir um jogo de canhões em metal ou resina para um melhor acabamento, e caso desejado, um conjunto de foguetes mais bem detalhados que os do kit e que não usei neste projeto (A Eduard tem uns muito bacanas, a propósito). Como se pôde ver ao longo da montagem, este não é um projeto para iniciantes. Um modelista com alguns kits no currículo, porém, será capaz de completar um belo modelo desse avião tão importante e tão pouco lembrado.
Para finalizar, uma galeria de fotos do modelo pronto.
Quer dizer, “quase” pronto pois ainda falta uma última camada de pigmento (pó) que normalmente só aplico antes de levar o modelo para algum evento… o que vai levar um tempo ainda
Se um dia ele for exposto eu posto aqui algumas fotos dele “na mesa”!
Obrigado à Eduard pelo envio deste kit